Skip to product information
1 of 1

Por Conta Própria ebook

Por Conta Própria ebook

Regular price $5.99 USD
Regular price Sale price $5.99 USD
Sale Pending
Format
Justine é louca?

Todos acham que sim...

Sua mãe. Os garotos da escola, os professores e os coordenadores também. Até os policiais que a pegam vagueando no meio da noite – e talvez principalmente eles.

O psicólogo de Justine diz que ela é ‘problemática’, mas isso significa a mesma coisa. Ele acredita que os pesadelos vívidos e recorrentes dela, além do seu comportamento agressivo, apontam para algum trauma do passado; mas Emy, a mãe de Justine, não consegue explicar isso.

Antes Justine tinha Christian, seu melhor amigo e parceiro de skate. Ele era o único que a aceitava. Talvez por que andar de skate seja o único momento em que Justine é realmente livre para ser ela mesma. Agora que Christian se foi... Justine tem o pensamento fixo de que chegou ao fundo do poço.

Mesmo quando ela vê a sua vida girando num turbilhão cada vez mais fora de controle, Justine não pode desistir do seu sentimento de quem ela é – alguém muito diferente da amável filha que Emy espera que ela seja – para simplesmente se ajustar e ser feliz. Justine tem certeza de que Emy mantém em segredo a chave para quem ela realmente é. Mas, se este for o caso, Emy não quer abrir o jogo.

À medida que PD Workman o leva para dentro da cabeça de Justine, você começa a imaginar o que, de fato, a faz agir da forma que age. Boa sorte, se você quiser tentar colocar o livro de lado antes de descobrir o porquê... – Tom Grusendorf, Jr.

Este livro é uma história maravilhosa e repleta de reviravoltas... que vai fazê-lo continuar virando as páginas até altas horas da madrugada. O final vai surpreendê-lo. Uma história incrível. – Linda S.

Nascida e criada em Alberta, P.D. Workman escreve instigantes livros de ficção dos gêneros de jovens adultos e suspense sobre doenças mentais, vício e abuso.
How can I get Early Access?

Returns

All sales are final.

If you have accidentally purchased the same ebook twice, please contact me and we will work it out with a refund or store credit.

View full details

Collapsible content

Click to Read Sample

CAPITÚLO 1
Ela acordou com A primeira luz do amanhecer. Tudo ao seu redor estava quieto. Havia sons distantes; um game show na televisão, vozes altas, o barulho do trânsito. Mas, no seu casulo, não havia nada. Nenhum movimento. Nenhuma respiração. Apenas silêncio.

Ela puxou o lençol, amassando-o como uma bola junto ao corpo e pressionando-o confortavelmente no rosto. Mesmo que não houvesse ninguém por perto, ela sentia uma presença. E tinha medo. Um obscuro sentimento de temor comprimia o seu estômago e tornava a respiração difícil, forçando-a a tomar fôlego de forma curta e superficial. Ela tentou manter a respiração silenciosa. Para que a presença não soubesse que ela estava ali. Se alguém soubesse que ela estava ali, algo terrível iria acontecer. Ela não conseguiu identificar em sua mente o que seria, mas a intensa ansiedade e apreensão fizeram seu coração bater forte e rápido. Ela colocou o lençol no rosto por mais alguns minutos. Então, finalmente, o afastou e começou a se mover. Ela rastejou pelo chão, com os sentidos em alerta. O apartamento estava na penumbra. Cheiros ruins pareciam atingi-la bem diante do rosto, mas não havia nada que ela pudesse fazer contra eles.

A fome dela começou a aumentar. Ela soluçou um pouco com a dor e a urgência que isso lhe causava. Não havia nada para comer. Passos se aproximavam lá fora, pelo corredor, e ela parou e esperou. Eles não pararam na porta. Eles não entraram. Ela continuou a sua jornada, engatinhando lentamente pelo chão. Levou uma eternidade até chegar ao outro lado. Ela estava fraca e tinha que parar para descansar frequentemente. A cada ruído, a cada arrastar de sapatos ou rangido do prédio, ela parava e escutava, esperando que acabasse. Esperando a dor. Temendo o pior.

Ela usou uma caneca para pegar a água da bacia. Era fria, suja e tinha um gosto repugnante, mas isso já não importava há bastante tempo. Refrescava seus lábios sedentos. Acalmava sua garganta dolorida. Enchia seu estômago duro e vazio. Ela arquejava por ar a cada caneca cheia, sem fôlego por causa da urgência de encher o estômago, mesmo que a água não fosse saciá-la por muito tempo. Então ela se deitou e encurvou o corpo, e tinha os olhos pesados.

Uma batida forte na porta acordou Justine com um susto. Ela se sentou, suspirando surpresa. Olhou a porta do quarto por um momento, desorientada, tentando descobrir onde estava e também tentando separar o sonho da realidade. Mais uma batida, e a voz exasperada da sua mãe.

“Justine! Acorda! É hora de ir pra escola!”

“Já tô acordada”, gritou Justine em resposta, sua desorientação e o medo do seu sonho interrompido alimentavam a sua raiva. “Me deixa em paz!”

“É melhor você estar banhada e vestida em dez minutos.”

“Acho que não vai dar”, resmungou Justine baixinho. Emy sempre estava tentando apressá-la.

Ela ficou lá, deitada na cama quente e macia por alguns minutos, fechando os olhos e tentando se lembrar dos detalhes do sonho. Ela tinha este sonho, ou outros parecidos, frequentemente. Ela odiava a hora de ir dormir à noite, sabendo que poderia sonhar. Ela sonharia com isso de novo e de novo, a noite toda. Quando acordasse de manhã, o sonho ainda estaria lá, nas fronteiras da sua consciência. Justine ficaria cansada e sentiria a manhã se arrastar lentamente na escola, se esforçando para se focar nas tarefas mundanas que os professores lhe passavam. Coisas sem sentido e inúteis. Então por que ela estava tentando se lembrar dos detalhes? Para se sentir como se sentia no sonho? Se era um pesadelo que ela evitava quando era mandada para a cama todas as noites, por que o estava buscando agora? Não fazia sentido. Mas isso fazia parte dela. Parte de quem ela era, e ela não entendia isso. Ela queria se entender, entender de onde vinham todos esses sentimentos e sonhos.

Ela estava meio que cochilando, vagando para o sono novamente, começando a se aproximar das fronteiras do sonho. Imagens desconexas piscavam em sua mente, simplesmente fora do seu alcance, simplesmente além da sua capacidade de compreender e reuni-las em algo que fizesse sentido.

“Justine!”, gritou Emy, e as batidas na porta recomeçaram.

“Já disse que estou acordada!”, gritou Justine através da porta. Ela jogou o lençol e o deixou todo amassado na cama. “Já me levantei, então pode parar de me perturbar!”

“Você vai chegar atrasada à escola. E vai me fazer chegar atrasada ao trabalho!”

“Não tô nem aí!”, rosnou Justine.

“Justine!” A voz de sua mãe estava cheia de frustração e fúria mal controlada. “Saia já daí! Agora!”

Justine sorriu com uma satisfação amarga pela raiva da mãe. Era bem feito para Emy, por ela ser tão tirana. Justine chutou a pilha de roupas ao redor da cama, procurando algo para a escola. Ela fisgou uma calça jeans rasgada e frouxa. Estava razoavelmente limpa. A coordenação costumava reclamar dela por causa dos furos nos joelhos, mas Justine não se importava. Ela tirou o moletom esfarrapado e a camiseta que tinha usado para dormir. Colocou a calça e procurou uma camisa. Uma blusa amassada e de mangas compridas seria o suficiente. Tinha um pouco de molho de tomate respingado na frente, mas sairia se ela não se importasse em esfregar com um pano. Justine deixou a blusa por fora da calça e pegou o seu gorro favorito no cabide atrás da porta. De crochê, com uma viseira que encobria o seu rosto e fazia ela parecer um vilão diretamente de um mistério do Sherlock Holmes. Ela o colocou na cabeça. Depois saiu do quarto.

Emy saiu da cozinha e olhou para Justine, quando a ouviu descer as escadas.

“Justine”, disse ela com uma voz pesada, cheia de desaprovação. “Você não pode ir para a escola desse jeito.”

“Qual é o problema?”, desafiou Justine. “Eu vou limpar a mancha. Ninguém se importa em como eu me visto.”

“Você deveria se importar em como se veste. É só que… parece que você está dormindo com essa roupa há uma semana. As pessoas vão pensar que não consigo cuidar de você direito.”

“Bem, você não consegue”, frisou Justine.

“Você não tomou banho.”

“Não. Estou atrasada, não tenho tempo.”

“Quando foi a última vez que você tomou banho?”, insistiu Emy.

“Não sei. Faz alguns dias.” Justine deu de ombros.

“As crianças na escola vão reclamar que você está fedendo. Você vai ficar com uma péssima reputação. Você não vai querer que todos pensem que você cheira mal. Ninguém vai querer ficar perto de você.”

“Por mim, tudo bem”, disse Justine secamente. Ela não precisava de ninguém. Eles podiam simplesmente manter distância.

Ela empurrou a mãe ao passar por ela e abriu a geladeira, procurando algo para comer antes da escola.

“Sente-se e tome um bom café da manhã”, disse Emy com firmeza. “Você quer cereais? Ovos? Torradas?”

Justine saiu da geladeira com um pedaço de pizza e uma garrafa de suco.

“Não tenho tempo para me sentar”, disse ela, “e é melhor você ir pro trabalho”, disse olhando para o relógio, “ou vai chegar atrasada.”

Emy olhou o relógio, sabendo muito bem que estava ficando tarde, e olhou de volta para a filha.

“Você vai direto para a escola?”, indagou ela.

“Vou”, disse Justine, bebendo o suco diretamente na boca da garrafa. Emy odiava isso. Justine observou a mãe fazendo cara feia. “Vou agora mesmo.”

“Não quero receber uma ligação dizendo que você chegou atrasada ou faltou. Penteie o seu cabelo antes de ir”, orientou Emy, aproximando-se lentamente da porta e pegando a sua pasta em cima da mesa.

Justine virou a cabeça, ignorando as instruções, e deu uma grande mordida na pizza.

“Te amo”, declarou Emy, e saiu em disparada pela porta.

Pelo menos ela não tinha tentado dar um beijo em Justine desta vez. Justine se inclinou por cima do balcão, comendo a pizza. Ela não tinha pressa nenhuma em ir para a escola. Observou Emy sair com o carro pela entrada da garagem e tomar o seu rumo. Justine comeu a pizza e bebeu o suco vagarosamente. Ela colocou na mesa o recipiente do suco tomado pela metade e o deixou lá.

Justine foi ao banheiro e se olhou no espelho. Ela ficava feliz em não se parecer com a mãe. Emy tinha cabelo loiro escuro, se vestia bem e era bonita, num visual bem chique. Emy gostava de ter uma boa aparência. Ela não gostava que cada vez mais rugas e linhas de expressão estivessem aparecendo no seu rosto, e colocava a culpa disso em Justine. Ela nunca teve rugas antes de Justine. Ou um fio de cabelo branco. Agora ela tinha, em geral, um aspecto cansado, e, às vezes, não tinha nem mesmo energia para brigar com Justine.

Justine, por outro lado, tinha cabelo castanho escuro, longo e com mechas volumosas. Seus olhos eram azuis, mas era um azul profundo e brilhante. Não eram como os olhos azuis pálidos e aguados de Emy. Ela tinha as mãos e os pés grandes, quase masculinos, e suas longas pernas esguias já a colocavam alguns centímetros acima da altura de Emy. Justine imaginava que tinha puxado as características físicas do pai, quem quer que ele fosse. Ou talvez houvesse outra mãe por aí, uma que realmente se parecesse com ela. Uma mãe que Emy mantinha em segredo.

O cabelo de Justine estava com uma longa trança, que ela usava para dormir; esta era a única forma que ela conseguia controlar o estresse do dia. Certamente era bem melhor que ter que passar shampoo, condicionador, pentear e secar o cabelo todos os dias. Mas Justine não tinha tomado nenhum cuidado especial ao fazer a trança, e inúmeros cachos tinham escapado e estavam pendurados desordenadamente na frente do seu rosto. Justine tirou o elástico da ponta da trança e começou a soltar o cabelo, desfazendo a trança e passando os dedos ao longo do seu comprimento, para posicioná-lo na frente do rosto e nas costas. Está bom. Ela não se preocupou em penteá-lo como Emy tinha sugerido. Ela esfregou o molho de espaguete que estava na camisa e conseguiu tirar grande parte, deixando apenas uma leve mancha alaranjada atrás. Justine jogou um pouco de água no rosto, passou desodorante nas axilas, e saiu da casa.

Ela pegou o seu skate longboard na porta da frente. Depois de descer os degraus da frente da casa, colocou o skate no chão, subiu nele e se transformou. Com o vento fazendo os seus cabelos voarem atrás dela, Justine sentiu os sentimentos negativos desaparecerem. Ela estava livre. Ela não era mais Justine, a filha de Emy. Ela não se sentia mais presa à terra. Era como se o vento soprando enchesse Justine como um balão, levantando-a, fazendo-a voar pelos céus acima da cidade. Ela soltava a respiração lentamente, saboreando os breves momentos de liberdade.

* * *

O tempo que ela levou para chegar à escola não foi suficiente. Justine desejava ter mais algumas horas só para andar de skate, deixando que o vento a preenchesse e dando aos seus músculos aquecidos tempo para se soltar e relaxar. Andar de skate sempre tinha sido uma válvula de escape. Andar de skate era uma das suas únicas e verdadeiras alegrias. Ela continuou em cima do skate quando saiu da calçada da rua para entrar na calçada da escola. O Sr. Berkoff, o zelador da escola, estava metodicamente limpando o lixo do chão, e gritou para ela.

“Desça do skate!”, gritou ele. “Você sabe que não é permitido andar de skate na escola!”

“Não estou fazendo mal a ninguém”, rosnou Justine. Mas ela desceu do skate e o pegou com a mão. “Não sei por que não é permitido.”

“Você poderia atropelar alguém”, disse Berkoff, começando a contar as possibilidades com os dedos. “Você poderia danificar a propriedade da escola. Isso atrapalha os alunos que já estão em aula… diferentemente de você, que parece que não lembra a que horas o sinal toca.”

“Talvez eu não tenha aula no primeiro período”, disse Justine, com um sorriso. “Talvez eu tenha tempo livre.”

“Você não tem tempo livre”, afirmou Berkoff.

Não que ele fizesse parte da coordenação. Não que ele soubesse quais eram as aulas dela. Ele só estava chutando. Tentando parecer inteligente, quando, na verdade, não era. Tudo que ele sabia fazer era coletar o lixo. Justine lhe deu um sorriso debochado com um ar de superioridade, e entrou na escola. Quando estava dentro da escola, pensou em colocar o skate novamente no chão e ir em cima dele até o armário. Mas se ela fosse pega – e as chances eram de que ela realmente seria –, as consequências seriam severas. Ela não queria ficar detida de castigo depois das aulas. Ela não queria passar ali mais do que o tempo necessário.

Quando Justine chegou ao armário, guardou o skate e pegou o calhamaço de livros que precisaria para as aulas da manhã. E pegou o celular para olhar as horas. Não estava tão atrasada, só dez minutos depois do sinal do primeiro período. Ela ainda assistiria grande parte da aula.

“Srta. Bywater”, disse uma voz desaprovadora, “você está bem atrasada.”

Justine se virou e viu o vice-diretor. O Sr. Johnson era alto e magro como um espantalho. Ele parecia um pouco amarrotado, como se também estivesse atrasado e tivesse precisado correr para chegar ao escritório a tempo. Seus cabelos finos e os óculos com armação em arame faziam-no parecer mais velho do que provavelmente era. Ele passou a mão na testa para enxugar o suor que escorria. Justine lhe deu um sorriso sem graça.

“Desculpe, Sr. Johnson”, ela pediu desculpas com uma voz que esperava soar sincera, “Acho que não ouvi o despertador e continuei dormindo, depois de ter ficado acordada até tarde limpando a casa ontem à noite, e minha mãe não estava lá para me acordar. Cheguei aqui o mais rápido que pude.”

“Não quero ouvir desculpas”, disse o Sr. Johnson decorosamente, alisando o seu paletó com ambas as mãos. “Não é a primeira vez que você se atrasa. Você já é bem grandinha, quase uma adulta. Não deveria esperar que outra pessoa lhe dissesse que é hora de se levantar. Você pode assumir a responsabilidade de se levantar na hora certa.”

“Eu sei. E normalmente faço isso”, disse Justine com sinceridade. “Foi só desta vez. Meu despertador estava programado, mas eu realmente estava cansada…”

“Então vá dormir mais cedo”, disse ele, balançando a cabeça e olhando para ela por cima da armação dos óculos.

Justine desfez o sorriso. Ela piscou os olhos rapidamente e olhou para o teto, como se estivesse segurando as lágrimas.

“Eu tive que trabalhar… mas… sim, Sr. Johnson.”

“Você é uma garota inteligente”, disse o Sr. Johnson, agora com um tom um pouco mais conciliador. “Eu não quero vê-la se metendo em problemas e desistindo da escola. Você tem futuro. Mas você tem que estar aqui, e tem que estar aqui na hora certa. Quando for adulta, será esperado que você chegue a tempo ao trabalho.”

“Sim, senhor”, concordou Justine.

Ele olhou as próprias mãos, aparentemente sem saber o que dizer depois.

“Por favor, melhore essa questão”, disse ele finalmente.

“Ok. Vou melhorar.”

O Sr. Johnson acenou sutilmente com a cabeça e se retirou. Justine o observou se afastando, chegando até o fim do corredor e dobrando.

“Velhote”, resmungou Justine.

Ela fechou a porta do armário e colocou o cadeado, trancando-o. Olhando o celular novamente, ela se dirigiu para a aula do primeiro período – agora, mais atrasada do que nunca. O Sr. Johnson queria que ela chegasse à aula a tempo, mas por que ficou conversando com ela no corredor quando ela deveria estar indo para a aula? Será que isso fazia sentido? Justine entrou na sala de aula e olhou ao redor. O professor estava de costas escrevendo na lousa, e Justine foi na ponta dos pés até a carteira e se sentou. Quando o professor se virou novamente para continuar a aula, seus olhos pousaram nela, e ele a encarou, franzindo as sobrancelhas.

“Atrasada, senhorita Bywater.”

“Sim, senhor”, concordou Justine, de cabeça baixa. “Eu já falei com o Sr. Johnson sobre isso.”

Ele ficou em silêncio por um momento, depois continuou a aula. Justine suspirou aliviada e abriu os livros.

* * *

Parecia que a hora do almoço não chegava nunca, mas finalmente o sinal tocou, e as multidões de alunos se aglomeraram no corredor, conversando e fazendo brincadeiras, correndo para os seus armários e, depois, para o almoço ou para a cafeteria para lanchar. Justine colocou os livros no armário e pegou o skate. Ela ficou na fila da cafeteria, impaciente com o skate ao seu lado. Estava morrendo de fome e não via a hora de pegar a comida. Havia duas garotas que Justine conhecia atrás dela na fila, e Justine conseguiu ouvi-las discutindo continuamente sobre o que pegar. Ambas queriam uns burritos bem grandes, mas não tinham dinheiro o suficiente para comprá-los. Ela se virou e olhou para elas.

“Eu consigo os burritos pra vocês”, ofereceu ela. “Vocês querem?”

Macy e Darlene trocaram olhares, e depois olharam para ela.

“O quê?”, perguntou Darlene. “Você tá falando com a gente?”

“Tô. Vocês querem os burritos? Eu compro pra vocês.”

Justine não aguentava ver alguém passando fome.

“Nós não precisamos que você compre coisas para nós”, garantiu Macy.

Justine deu de ombros e foi em frente. Ela colocou três burritos na bandeja, e um achocolatado. Se as garotas estavam observando as escolhas dela, elas não tinham nada a dizer sobre isso. No caixa, Justine pagou pelas refeições. Macy e Darlene saíram atrás dela. Justine se virou e presenteou as garotas com um burrito para cada uma, colocando-os nas suas bandejas.

“De onde você tirou todo esse dinheiro?”, desafiou Darlene, olhando diretamente para as roupas rasgadas e baratas de Justine.

“Eu ganhei”, mentiu Justine, “numa aposta.”

Darlene revirou os olhou e balançou a cabeça.

“Não ganhou nada.”

Justine deu de ombros.

“Então, vocês os queriam, certo? E eu os consegui pra vocês.”

Darlene concordou com a cabeça.

“Mesmo assim, você não vai se sentar com a gente”, sorriu Macy desdenhosamente.

Justine sentiu o seu rosto congelar como se fosse uma máscara. Ela tinha comprado o almoço delas, para elas não ficarem com fome, e elas ainda iam agir como se ela fosse uma leprosa? Elas podiam comer a comida dela, mas não podiam se sentar na mesma mesa que ela?

“Eu não vou comer aqui, de toda forma”, disse Justine contundentemente. “Por que eu iria querer comer com vocês?”

Justine deu meia volta e foi embora. Ela se livrou da bandeja e levou apenas o próprio burrito e o achocolatado. Ela avançou para fora da cafeteria e para fora da escola. Ela estava morrendo de raiva por causa do desprezo das duas garotas. Mas por que ela se importaria? Nem gostava delas mesmo. Ela não se importava com o que ninguém da escola pensava dela. Ela não precisava se sentar com ninguém da escola. Ela era uma garota madura, independente, durona. Ela não precisava se sentar com os amiguinhos, como no jardim de infância. Justine colocou o skate no chão e subiu nele, e deslizou rapidamente pelas calçadas. O vento batia no seu rosto, seus cabelos voavam atrás dela como uma faixa, e seu coração batia forte, enquanto ela tomava impulso cada vez mais rápido. Aquelas garotas não eram nada. Será que sabiam andar de skate? Será que conseguiam fazer alguma coisa além de colocar uma maquiagem tão pesada só para ficarem parecendo com prostitutas? Por que ela iria querer alguma coisa com elas?

Depois de um tempo, Justine desacelerou. Ela continuou andando de skate numa velocidade mais baixa, comendo o seu burrito. Os grandes burritos faziam muito sucesso na escola, e apesar de serem bem embalados em plástico, era uma bagunça tentar comê-los. Mesmo que Justine tomasse cuidado, ele pingava, e a camisa semi-limpa dela ficava manchada novamente. Como é que alguém comia aquelas coisas sem se melar todo? Justine teria dado tudo para ver Darlene e Macy tentando comer os burritos delas, limpinhas e delicadas, passando guardanapo no cantinho da boca. Com a aparência que elas tinham, Justine achava incrível que elas sequer cogitassem comer burritos. Uma salada encheria demais. Um pensamento passou pela cabeça de Justine. E se elas tivessem falado só para ver qual seria a reação dela? Talvez elas nem quisessem comer burritos, no final das contas, e só queriam saber como ela reagiria, se ela iria se intrometer e fazer papel de boba lhes comprando algo que elas nunca nem mesmo considerariam comer. Justine sentiu o seu rosto ficar vermelho, e o seu coração começou a bater forte novamente, por causa da raiva, e não do esforço físico. Será que estavam só brincando com ela? Será que só queriam ver se ela gastaria o seu dinheiro com elas? Desperdiçá-lo? Mostrar interesse em ser amiga delas para que pudessem zoar com sua cara mais uma vez? Justine estava com tanta raiva que jogou a outra metade do burrito numa lata de lixo enquanto passava com o skate. Seu sangue estava fervendo.

Ela deu uma volta na lagoa, passando rapidamente por passeadores de cães e mulheres empurrando carrinhos de bebê. As pessoas lhe olhavam com olhares irritados, mas ninguém lhe disse que ela tinha que ficar longe do parque. Ela desceu uma das suas ladeiras favoritas, e deu uns saltos sem muita vontade. Então já era hora de voltar para a escola novamente. Justine voltou ao seu armário antes de o sinal tocar, pois não queria ser repreendida por chegar atrasada duas vezes no mesmo dia. Ela passou por Macy e Darlene, que cochicharam e deram risadinhas uma para a outra, olhando para Justine enquanto ela passava.

* * *

Na aula de matemática, Megan se virou quando Justine se sentou. Ela sorriu amigavelmente para Justine. Megan tinha cabelo curto e usava óculos redondos com uma armação preta que Justine achava fazer Megan se parecer um pouco com a Velma, do Scooby Doo. Ela só precisava colocar um suéter laranja.

“Oi Justine.”

Justine a cumprimentou com a cabeça, não retribuindo o sorriso.

“Oi”, disse ela brevemente, e abriu os livros.

“Você tá bem?”, perguntou Megan.

“Tô, por quê?”

“Sei lá, parece que tá chateada ou algo assim. Só estou perguntando.”

“Me deixa quieta”, resmungou Justine. “Eu tô ótima.”

Megan se virou novamente. Phillip estava virado na frente de Megan, e disse algo para ela. Megan balançou a cabeça e eles aproximaram as cabeças um do outro e falaram baixinho por uns instantes, depois ambos olharam de novo para Justine durante a conversa. Justine não conseguia ouvir o que estavam dizendo sobre ela, mas, quase no final da conversa, ela ouviu um nome que lhe apunhalou no coração. ‘Christian’. Megan lançou mais um olhar de pena em Justine e se virou para a frente, enquanto o professor começava a aula. Justine abaixou a cabeça nos braços dobrados, fechando os olhos, com dolorosas lembranças surgindo em seus pensamentos. Seu coração doía.

* * *

Depois das aulas, Justine foi para casa para lanchar algo. Ela estava cansada e estressada, e só queria ficar vegetando em frente à televisão, comendo as suas porcarias favoritas. Mas quando chegou em casa de skate, viu que o carro de Emy já estava estacionado na frente da garagem. Ela tinha saído mais cedo do trabalho, ou tinha trazido o trabalho para casa para continuar trabalhando. Nenhuma das duas opções agradava a Justine. Ela não iria conseguir relaxar em casa com Emy estando lá.

Com uma respiração profunda e um suspiro, Justine abriu a porta da frente e entrou em casa, fazendo barulho. Emy olhou o material dela espalhado em cima da mesa da cozinha.

“Oi, meu bem”, cumprimentou ela alegremente. “Como foi na escola hoje?”

Justine revirou os olhos e passou direto pela sala de jantar e entrou na cozinha.

“Só preciso de algo para comer”, disse ela.

“Já preparei uma coisinha para você. Eu sei como você chega em casa com fome depois da escola.”

Justine olhou o prato de maçãs fatiadas e o copo de leite no balcão da cozinha.

“Fala sério!”, soltou ela. Quantos anos ela tinha, cinco? Ela enfiou a cabeça na geladeira e deu uma olhada. Obviamente Emy já tinha limpado tudo. O resto da pizza tinha sumido. Assim como o macarrão com queijo que Justine tinha feito no dia anterior. Justine foi para os armários, empurrando caixas de cereal e várias mercadorias. A limpa que Emy tinha dado na cozinha não tinha conseguido encontrar um pacote de salgadinhos que Justine tinha escondido. Justine o pegou e abriu a parte de cima para mergulhar dentro dele. Não tinha refrigerante ou achocolatado na geladeira. Mas Emy não conseguia se livrar da sua xícara de café diária, então isso ainda estava disponível, e Justine começou a preparar um café.

Emy entrou na cozinha alguns minutos depois, provavelmente sentindo o cheiro do café, e olhou Justine comendo os salgadinhos e bebendo seu espresso.

“Justine! Estamos tentando comer coisas saudáveis! Você não pode comer isso!”

“Eu posso comer o que eu quiser”, disse Justine, enfiando na boca outra mão cheia de salgadinhos, para caso Emy decidisse tentar tomá-los dela.

“Não, você não pode comer o que quiser. Isso faz mal para o seu corpo, e faz mal para o seu humor e o seu cérebro. Nós concordamos que precisávamos começar a comer de forma mais saudável, e nos livrar de todas essas porcarias que você come. O Dr. Morton disse…”

“Eu nunca concordei com nada”, interrompeu Justine. “Você e o Dr. Morton decidiram tudo isso, não eu. Eu nunca concordei em deixar de comer a minha comida e começar a comer saladas e droga nenhuma. E vocês não podem me obrigar.”

“Corpo são, mente sã”, repreendeu Emy. “Há estudos que mostram que com tratamentos nutricionais e biomédicos, você pode mudar a química do seu cérebro…”

“Eu não sou um rato de laboratório”, rosnou Justine. “Vocês não podem fazer experimentos com o meu cérebro!”

Emy riu.

“Nós queríamos que você se sentisse melhor. Nós queríamos que você se sentisse segura, que fosse feliz…”

“Vocês não fazem eu me sentir segura mexendo com o meu cérebro. E não quero que vocês mudem o meu cérebro!”

Justine tinha certeza de que se Emy conseguisse fazer com que o Dr. Morton concordasse com ela, ela logo estaria lhe prendendo eletrodos na cabeça.

“Não é como se nós a estivéssemos operando, ou injetando produtos químicos nocivos em você, ou até experimentando mais medicamentos de prescrição. Estamos apenas falando em comer de forma saudável, nutrir o seu corpo. Talvez quando você estava doente, quando era bebê, o seu corpo e cérebro não tenham absorvido tudo que precisavam. Talvez com o trauma, os nutrientes tenham sido exauridos quando você estava doente, talvez bem naquela época, isso tenha mudado as coisas, então…”

Ela parou de falar. Justine encarou Emy, deliberadamente mastigando os salgadinhos. Ela os engoliu com outro gole de café.

“Você não pode me obrigar”, repetiu ela.

“Se eu só comprar comida saudável e isso for tudo que tiver na casa…”

Justine encheu a boca com uma mão cheia de salgadinhos e os mastigou, com suas bochechas lotadas. Emy soltou o ar frustrada, e jogou as mãos para cima com nojo, virando-se e saindo da cozinha. Justine balançou a cabeça para ela e engoliu a massa de salgadinhos.

“Não mexa com a minha comida”, disse ela para o silêncio da cozinha. “Não vou deixar você fazer eu passar fome.”

Emy a deixou em paz por enquanto, e Justine subiu para o seu quarto para fazer a tarefa de casa. Mas, logo depois, Emy estava lá, abrindo a porta de repente, sem bater e invadindo o santuário de Justine. Aquilo fez Justine dar um pulo, e a explosão de adrenalina a deixou instantaneamente com raiva.

“Saia daqui!”, gritou Justine, machucando a garganta com a violência do grito. “Você não pode entrar aqui desse jeito! O Dr. Morton disse que você tem que respeitar a minha privacidade!”

O rosto de Emy estava carrancudo. Seus lábios estavam pressionados juntos, numa linha fina, e Justine se viu procurando ao seu redor por rotas de fuga. Emy estava chateada com algo, e se Justine tivesse, de alguma forma, ido um pouco além da conta…

“Cadê o dinheiro que estava na minha bolsa?”, bradou Emy.

Justine se esforçou para assumir uma atitude casual e despreocupada, esticando-se na cama e dando de ombros amplamente.

“Não sei. Cadê o dinheiro que estava na sua bolsa?”, perguntou ela.

“Você o roubou de mim. Você mexeu na minha bolsa e roubou o meu dinheiro!”

Justine levantou as sobrancelhas.

“Por que eu faria uma coisa dessas?”

“Porque você é uma bisbilhoteira ingrata! Não posso acreditar que depois de tudo que passei para ajudar você, para lhe dar do bom e do melhor, para tentar criá-la e fazer você se sentir segura, você ainda me roube! Por quê, Justine?”, indagou ela, com a voz ficando fina.

Justine recuou diante do tom elevado dela.

“Fala sério!”, disse ela. “Você vai jogar tudo nas minhas costas por que não sabe onde colocou o seu dinheiro? Que bela criação, Emy.”

“Você o roubou!”

“Prove”, disse Justine calmamente, com os olhos bem abertos e inocentes.

Emy a encarou, com os olhos cheios de fúria. Justine lutou para manter a ansiedade sob controle.

“Eu sei que você o roubou, e você sabe que o roubou. Nós não estamos num tribunal. Não se trata de provar. Trata-se de você violando o meu espaço e roubando o meu dinheiro.”

“Bem, se você tem tanta certeza de que eu roubei o seu dinheiro, o que vai fazer em relação a isso?”, desafiou Justine.

As sobrancelhas de Emy se abaixaram furiosamente.

“Você está de castigo, pra começar. E eu vou falar com o Dr. Morton sobre isso. Você vai ter que trabalhar para recuperar esse dinheiro.”

“Ah, você vai me dedurar para o Dr. Morton?”

“Estou procurando uma forma de ajudá-la, Justine!”

“Falar com um charlatão não me ajuda. Será que ele conseguiu me ajudar nos últimos dez anos?”

Emy olhou para ela por um momento, com o olhar de raiva começando a desaparecer.

“Eu acho que ele estava ajudando você por um tempo”, disse ela lentamente, “mas depois…”

A raiva de Justine aumentou com a insinuação de que ela estava doente e que eles podiam ajudá-la a melhorar.

“Não tem nada de errado comigo”, desafiou ela. “É você quem tem algo de errado. Você acha que pode ficar mandando em mim e que se eu não for uma filha obediente, então deve haver algo de errado com o meu cérebro. E o Dr. Morton fica feliz em arrancar o seu dinheiro e continuar dizendo como o meu cérebro está bagunçado. Isso é um golpe, Emy. Ele é só um charlatão. Todas aquelas terapias estúpidas – momento do abraço, terapia do jogo, os estúpidos truques para treinar cães – você acha que pode me mudar, mas não pode!” Emy abriu a boca para dizer algo, e Justine gritou mais alto. “Não pode!”

“Você estava começando a melhorar”, observou Emy. “Você e eu estávamos começando a conseguir interagir melhor, a ter um relacionamento. E depois…”, ela balançou a cabeça, com os olhos cheios de lágrimas. “O que aconteceu, Justine?”

“Não aconteceu nada”, disse Justine com firmeza, encarando-a diretamente nos olhos. Emy abriu a boca. “Não aconteceu nada”, repetiu ela novamente, com a voz ríspida, e a garganta ferida de tanto gritar. “Nada.”

Emy balançou a cabeça. Ela tinha os olhos tristes, e a raiva sobre o dinheiro roubado tinha sumido. Ela tinha aquele olhar amoroso e de pena que fazia Justine se sentir encurralada. Emy atravessou o quarto, e Justine se encolheu, não por estar com medo de levar uma surra, mas porque sabia o que iria acontecer.

“Não me toque”, avisou ela.

Emy se sentou na cama e colocou o braço em torno de Justine. Justine ficou dura, e não retribuiu o gesto.

“Eu amo você, Justine.”

“Não, não ama.”

“Eu sou a sua mãe. Você é o meu bebê. E não importa o quanto você tente me afastar, eu ainda amo você.”

O abraço de Emy ficou mais forte, e ela se balançou um pouco. Justine se contorceu dentro do abraço dela.

“Eu não sou mais um bebê”, protestou Justine. “Você não pode me abraçar!”

“Você ainda é a minha filha. Eu ainda amo você. E eu sei que você precisa de abraços, mesmo que me diga que não precisa.”

Justine a empurrou, contorcendo-se para fora do abraço.

“Afaste as suas mãos de mim”, objetou ela, “senão eu vou ligar para o Serviço de Proteção à Infância.”

“E vai dizer para eles que eu te abracei?”, perguntou Emy, com uma risada curta.

“E dizer para eles que você me tocou quando eu disse ‘não’ e fez eu me sentir desconfortável. Você não pode me tocar assim. Eu conheço os meus direitos. Eu não tenho que deixar ninguém me abraçar ou me tocar. Nem mesmo você.”

A expressão de Emy se entristeceu, e Justine sabia que tinha sido entendida. Mas Emy permaneceu calma e firme. Ela teria deixado o Dr. Morton orgulhoso. Ela forçou um sorriso estático, e o amor já não brilhava nos seus olhos.

“Assim que o Serviço de Proteção falasse com o Dr. Morton, eles entenderiam. Nada aconteceria”, disse Emy, com uma despreocupação calculada.

Ambas encararam uma à outra, desafiando a outra a fazer um movimento. Por fim, Emy se levantou e saiu pela porta.

“Você está de castigo”, lembrou ela a Justine, enquanto se retirava. Ela puxou a porta e a fechou atrás de si.

Justine ficou sentada olhando para a porta fechada, e xingou Emy, murmurando.

P.D. (Pamela) Workman is a USA Today Bestselling author, winner of several awards from Library Services for Youth in Custody and the InD’tale Magazine’s Crowned Heart award, and has published over 100 mystery/suspense/thriller and young adult books.

Workman loves writing about the underdog. She has been praised for her realistic details, deep characterization, and sensitive handling of the serious social issues that appear in her stories, from light cozy mysteries to darker, grittier young adult and mystery/suspense books.

P. D. Workman does not shy from probing the deep psychological scars of childhood trauma, mental illness, and addiction. Also characteristic of this author, these extremely sensitive issues are explored with extensive empathy, described with incredible clarity, and portrayed with profound insight.
—Kim, Goodreads reviewer